08 maio 2016

Casa - Texto

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Há um ano escrevia "Casa". De lá pra cá, minha escrita e muita coisa mudou - males da adolescência. Entretanto, os significados dessas que já são "velhas" palavras, de nada perderam seu significado. 
Casa

Às vezes tenho saudade de casa. Não de uma feita de tijolos ou de concreto, mas sim de algo muito mais mágico e profundo do que as superficiais criações humanas. Um lugar feito a partir dos infinitos horizontes além das montanhas, da maior abstração já examinada, feito do que ainda é, até hoje, um grande desafio aos mais inspirados poetas.

Lembranças da casa dos abraços, de seus calores indescritíveis, de seus confortos inigualáveis. Suspiros da casa dos tantos beijos, dos molhados de seus lábios e das lágrimas de seus sentires. Saudade daquela morada no ventre entre a vida, das dóceis e distantes memórias de criança, da divindade em luz que aquele velho lar representara.

Da criação à vida até aos estranhos caminhos distantes que tomamos, perdendo a noção da passagem dos ponteiros no relógio da sala, nos ocultando em nossas próprias tolas aceitações, escondendo-nos na caixa de papelão, naquela que um dia fora um foguete ou um império inteirinho. Mas é assim, difamamos nossos mapas com rabiscos confusos e rotineiros, riscando-os em direções banais e quase sempre tão sem sentido.

No fim, caminhamos ao fosso das amnésias, não só de nós mesmos, mas de onde viemos, de quem viemos, de toda a bela e extraordinária sensibilidade humana e até mesmo dos detalhes da profunda morada, tão grande e especial nas profundezas da memória, mas tão pequena e passageira em nossa realidade sombria. Havia uma caixa empoeirada, esquecida em cima do armário, e foi no vislumbre daqueles velhos álbuns, repletos de antigas fotografias, que me peguei perguntando; afinal, por que saímos de casa?

Ao tempo e às suas peças diariamente brindamos, empurramos, esquecemos, nos alimentamos da esperança da não existência de seus tantos limites em uma quase crença de um infinito expressivo. A sensação de eterno que nos condena à inércia. Mas talvez, de fato, seja apenas mais um lugar, mais uma essência, mais uma casa de tantas outras milhares de casas por ai, mas é na unicidade tão límpida de cada uma que descubro o magnífico, que resolvo chamar de saudade. Olho para a grande mochila das experiências, para o cantil do meu sensitivo e uma doce voz percorre milhões de lembranças de infância até ecoar em minha mente. — Vá, pequeno andarilho.

Desde que fui, não sei dizer, mas às vezes sinto saudade de casa, um aperto no peito, um ápice. Tenho medo. Medo de não haver tempo, de que tudo acabe. Medo que, aos poucos, motiva a coragem de por fim escalar aquelas montanhas, cruzar aquele horizonte em busca de lar, aconchego, velhos cheiros. Curiosidade de retornar e ser capaz de observar o invisível, de desafiar aqueles poetas, de sentir o palpável dos sentimentos através do mais verdadeiro e sincero de todos os amores, dentre todas as formas de amar.

Bato naquela velha porta, sentindo a ansiedade me consumir na lentidão de seu abrir, ao passo que preencho meu universo de antigas caixas, de novas fotos velhas aos meus calejados álbuns. Enfim encaro aqueles olhos familiares, instantaneamente marejados, naturalmente profundos e já levemente enrugados. A imensidão daquele olhar desperta a sensação adormecida de nunca dali ter saído, e diante daquele espelho, choro como criança , enquanto, sem palavras, abraço a matéria do imaterial.

— Estou em casa, mãe.
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Texto por P. Barros


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