18 fevereiro 2016

Devaneios - Texto Reflexivo

/
0 Comentário(s)

Devaneios Metalinguísticos

Sempre foi comicamente trágico refletir sobre os dias. Seja pela assustadora velocidade em que terminam, pelo estranho modo como podem eles serem facilmente confundidos com dias que se passaram ou com outros que ainda se passarão e até mesmo pela percepção crua de que tudo e nada acontece e deixa de acontecer ao mesmo tempo. Talvez seja apenas um tolo devaneio que escure nas sombras, entristecendo o colorido vivo de uma percepção iludidamente lúdica. Porém, pelo menos para mim, a vida sempre foi um triste presente previsível, onde nem mesmo a farta fuga é capaz de inundar a profunda e vasta dimensão da psique humana com uma fagulha de felicidade sem se perder em suas infinitas direções.

Tudo tende ao óbvio aparente, desde o tempo futuro até a reflexão daquilo que nós somos, e é curioso notar como tal reflexo, como praticamente tudo neste mundo, varia de acordo com cada perspectiva. Muitos limitam o conceito aos traços desenhados nos espelhos que rodeiam os tais dias, e lá conseguem ver as cores que procuravam, se sentem vivos, acompanhadas por memórias felizes de pessoas distantes, como um preenchimento de ego e ilusão aos vazios da existência. Mas existe maldição impregnada naqueles que não enxergam seus reflexos nas meras criações humanas, naqueles que apenas através da fragmentação de seus seres são capazes de encontrar as suas fontes, estas vazias em um longo segmento solitário e cinzento.

Admirei por muito a habilidade de alguns de se encherem tão rápido da água fútil invejada, até entender em um vento do pensamento que apenas o pequeno se encheria fácil, enquanto o vazio profundo não se encheria nunca, insaciável. É incrível perceber como é do tal nada que surgem as mais extraordinárias criações, quando em uma folha em branco se cria a abstração de um sentimento triste em colorido ou feliz em obscuro, como através da expressão do profundo inexistente se transmitem os mais variados sentires, atravessando as dimensões compreendidas e transcendendo o próprio tempo e a própria vida, orquestrando a musica dos sentimentos inexplicáveis e indescritíveis através da louca pintura entusiasta das palavras que roubam a alma. Palavras que assim como seus artistas são vazias, mas do fundo de suas essências, combinada a outras milhares de magias, se transformam na mais bela e inacreditável expressão humana, superando sua própria capacidade e o tornando agora capaz de encher suas fontes, não da água sem nada, mas do mais verdadeiro sangue da alma, manchando as folhas de fragmentos de seu corpo. Pedaços que somam as experiências da verdadeira reflexão do que verdadeiramente somos, um reflexo que vai além da imagem e do entendimento, que se esconde por trás de todos os cheios vazios que auto criamos para nossas próprias infelizes defesas.

E hei de entender ainda a capacidade de através das palavras, da leitura das minhas migalhas conseguir eu viajar no tempo, mais do que ver o meu próprio passado como também trazer de lá tudo que aquele momento proporcionava; as tristezas, as alegrias, as lembranças e feridas, como uma extensão secreta do universo, como uma ciência oculta. E nem me desafiaria a tentar entender a literatura de escritas alheias do vermelho, que me permitem explorar situações em que nunca estive, tempos em que nunca vivi, espaços e segmentos em que nunca sonhei de existirem, onde a criação imaginável supera o criador limitado.

Eu sei que sempre foi comicamente trágico refletir sobre tudo, dos dias até a vida, da tolice à genialidade, do fútil ao universal, da musica ao silêncio, do óbvio ao incompreensível, de tudo que nos rodeia e nossa desconhecida fenda emocional, capaz de facilitar o complexo para os tolos e transformar o simples em um belo tenebroso abismo infinito para os condenados do mais belo reflexo secreto e mágico dos homens. E é depois de tanto navegar no mar de meu mundo incompreendido, entre tantos amores e horrores, tempestades e calmarias, é que descubro que no fim, a arte de fazer arte está na breve alegria de se sentir único, mas na eterna tristeza de estar sozinho.


Posts relacionados

Nenhum comentário: